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Moda e Algoritmo: Ética, Transparência e Futuro Digital

Entre deepfakes, dados e greenwashing — o que o futuro da Moda exige? Por Marcele Guarenti

A moda sempre foi o espelho da cultura. Agora é, também, espelho de dados.

À medida que algoritmos aprendem nossas preferências e tecnologias vestíveis se fundem ao corpo, surge um novo dilema: quem é dono da nossa imagem, do nosso estilo e do nosso dado?

 

O que antes era apenas estética, tornou-se infraestrutura ética. E nesse cenário, três temas despontam como cruciais para o futuro do Fashion Tech: Deepfakes e direitos de imagem, Greenwashing digital, Privacidade de dados e sustentabilidade da inovação.

 

 

Deepfakes e o Direito à Própria Imagem

Modelos digitais hiper-realistas e avatares criados por IA já substituem pessoas em campanhas e desfiles virtuais. O fascínio é inevitável mas o risco também. Estudos recentes mostram o aumento do uso indevido de imagens de profissionais e influenciadores da moda em conteúdos sintéticos, sem consentimento e sem remuneração justa (Fashion ABC, 2025). Enquanto alguns celebram a “democratização da imagem”, outros alertam: a IA está criando uma nova camada de exploração invisível — uma estética sem corpo, porém com dono.

As marcas mais visionárias estão se movendo rapidamente diante desse novo cenário, incorporando cláusulas específicas de “uso digital de imagem” em contratos de modelos, creators e embaixadores, garantindo respaldo jurídico diante de deepfakes e manipulações de conteúdo. Paralelamente, projetos-piloto com selos de autenticidade — aplicados em fotos, vídeos e campanhas criadas por IA — começam a se tornar padrão em iniciativas que unem transparência, rastreabilidade e confiança. É um movimento que sinaliza uma nova governança estética: onde ética e inovação caminham juntas para preservar o valor simbólico e a credibilidade das marcas no ambiente digital.

 

Greenwashing Digital: A Sustentabilidade Performática

Com a ascensão da Moda digital e dos marketplaces de second life fashion, o discurso da sustentabilidade invadiu o online. Mas, sob o brilho do marketing verde, há pixels cinzentos.

Pesquisas apontam que quase 40% das comunicações de sustentabilidade na Moda carecem de comprovação factual (MDPI Journal of Sustainability, 2025). No digital, o greenwashing ganhou novas formas: métricas manipuladas, “impactos compensados” e IA gerando imagens de florestas e tecidos ecológicos que nunca existiram.

No front da inovação ética, marcas globais e startups emergentes começam a redefinir o conceito de transparência na Moda. Uniqlo e Zara já testam os Digital Product Passports (DPP), que permitem rastrear a origem, os materiais e o ciclo de cada peça — um passo decisivo rumo à rastreabilidade total. No universo do luxo, grupos como a LVMH apostam em blockchain ambiental, transformando o ciclo de vida digital dos produtos em dados públicos e verificáveis. Enquanto isso, startups europeias desenvolvem auditorias automatizadas de sustentabilidade, cruzando informações reais de produção com o que é comunicado nas campanhas, expondo possíveis incoerências e combatendo o greenwashing digital. O resultado é um novo paradigma de confiança, onde a inovação não é apenas estética, mas também ética e mensurável.

 

Privacidade de Dados e Sustentabilidade da Inovação

Na Moda conectada, cada clique deixa um fio de dados. E esses fios tecem padrões de comportamento, preferências e até previsões de consumo. A questão é: quem costura esse tecido digital? No cenário de lojas inteligentes e provas virtuais, dados biométricos se tornaram a nova moeda do varejo. Porém, a coleta descontrolada ameaça um princípio essencial — a autonomia do consumidor. A Comissão Europeia já discute legislações específicas para regular o uso de dados em experiências de moda digital e wearables (Fashion Brain Project, 2025).

Em resposta à crescente preocupação com a privacidade e o uso ético dos dados, as marcas estão reformulando suas estratégias digitais com base em transparência e responsabilidade tecnológica. A Nike desponta como referência ao adotar IA explicável (XAI) — tecnologia que personaliza recomendações de produtos sem violar a privacidade do usuário, tornando o processo de decisão algorítmica compreensível e auditável. Já a Farfetch experimenta sistemas de consentimento granular, nos quais o consumidor define exatamente quais dados deseja compartilhar, ampliando o senso de controle e confiança. Paralelamente, marcas independentes inauguram uma nova vertente chamada “sustentabilidade da informação”: um modelo que prioriza qualidade sobre quantidade, reduzindo o armazenamento de dados desnecessários e otimizando o processamento digital. Juntas, essas iniciativas inauguram uma era em que ética e eficiência tecnológica se tornam o novo diferencial competitivo do Fashion Tech.

 

 

Em um mercado em que o público exige propósito, ética é branding. A Moda do futuro não será apenas digital, será consciente. Ela precisará compreender que cada byte também carrega valores, identidades e responsabilidades. O tecido do amanhã será entrelaçado com linhas de código — mas é no fio ético que se tecerá o verdad

eiro valor da Moda.

 

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