
Tenho observado uma mudança silenciosa, mas significativa, no modo como as empresas brasileiras estão tratando a cibersegurança. O que antes era visto apenas como um custo obrigatório para atender normas, agora começa a ser entendido como fator de sobrevivência — e, para algumas organizações, como uma vantagem competitiva real.
Durante muito tempo, a abordagem era básica: contratava-se um consultor, respondia-se a um questionário, implementava-se o mínimo necessário para “cumprir tabela” e pronto. Muitos gestores tratavam a segurança digital como um seguro contra incêndio: é bom ter, mas a gente torce para nunca usar.
Esse cenário, felizmente, está mudando. Tenho conversado com líderes que passaram a entender que uma boa governança de cibersegurança não é apenas para evitar multas ou atender à LGPD. É o que garante que sua operação continue de pé quando o imprevisto bater à porta — ou quando o concorrente estiver vulnerável e você, não.
Veja o que acontece quando uma empresa é atacada por ransomware. Se ela tratava a segurança como mero item de conformidade, provavelmente vai ficar semanas tentando restaurar sistemas, entender o que foi comprometido, correr atrás de backup — muitas vezes sem sucesso. Mas se houver uma estrutura madura de governança, bem pensada, testada e mantida, essa mesma empresa pode voltar à operação em poucas horas.
A diferença raramente está só na tecnologia. Está na cultura, nos processos e na clareza organizacional sobre onde estão os dados críticos, quem acessa o quê e como responder a um incidente com agilidade. Empresas resilientes se planejam, testam cenários, comunicam bem e sabem o que fazer quando tudo dá errado.
Esse novo entendimento vem em boa hora. O Brasil se tornou um alvo recorrente. Empresas brasileiras lidam com dados valiosos, mas ainda operam — muitas vezes — com estruturas frágeis de defesa. E o perfil do atacante mudou: hoje, são grupos estruturados, que fazem reconhecimento prévio, identificam vulnerabilidades e aplicam ataques direcionados com alto grau de eficiência.
Em paralelo, vejo um movimento interessante nas organizações que estão mais avançadas: elas não estão simplesmente copiando modelos norte-americanos ou europeus. Estão criando abordagens próprias, adaptadas à nossa cultura corporativa. Aqui, relacionamentos e agilidade importam tanto quanto tecnologia. E isso não é um defeito — é uma força.
Enquanto empresas estrangeiras tendem a se apoiar em processos pesados e hierarquias rígidas, vejo empresas brasileiras usando sua flexibilidade e inteligência relacional para montar estruturas mais adaptativas, com resposta rápida e comunicação fluida. Isso, quando bem canalizado, gera resiliência de verdade.
A LGPD também teve papel importante nesse avanço. Ela forçou um olhar mais atento à governança de dados — e quem entendeu que dados bem governados são a base da segurança, saiu na frente. Porque saber onde estão suas informações, quem pode acessá-las e com que propósito já resolve metade dos riscos mais sérios.
E os resultados já aparecem. Tenho visto empresas fecharem contratos justamente por demonstrarem maturidade em segurança — seja com clientes do setor financeiro, saúde ou varejo. Outras conseguiram entrar em mercados regulados, nacionais e internacionais, porque estavam preparadas para cumprir exigências que a concorrência não conseguia.
O maior diferencial, no entanto, está na mentalidade. Organizações que levam a segurança a sério criam uma cultura de atenção ao risco. Pensam com mais profundidade, tomam decisões com mais consciência, recuperam-se mais rápido de imprevistos — e isso tem valor inestimável em um país tão dinâmico (e volátil) quanto o Brasil.
Agora, é importante lembrar: não existe atalho. Governança real em cibersegurança exige investimento, alinhamento entre áreas, disciplina e, principalmente, um redesenho do jeito de pensar. Não se trata de software ou dashboards — trata-se de maturidade institucional.
As empresas que entenderem isso primeiro — e agirem com consistência — vão se destacar. Não só aqui, mas globalmente. Porque as competências que desenvolvemos ao implantar uma governança de segurança bem feita — como visão sistêmica, gestão de riscos, agilidade na adaptação e construção de confiança — são exatamente as que definem o sucesso na economia digital atual.
Regulação pode ter sido o ponto de partida. Mas a oportunidade real está em transformar a cibersegurança em uma base estratégica para negócios mais inteligentes, sustentáveis e preparados para o futuro.