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O USO EXCESSIVO DE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL PODE PREJUDICAR SEU CÉREBRO? ENTENDA OS RISCOS E COMO SE PROTEGER

Por Calza Neto

Você já parou para pensar que a inteligência artificial, essa tecnologia que facilita tanto a nossa vida, também pode estar silenciosamente enfraquecendo a sua capacidade de pensar por conta própria? Pesquisas recentes têm chamado atenção para um fenômeno que muitos preferem ignorar: o uso excessivo de IA pode comprometer sua memória, reduzir seu foco e tornar seu raciocínio cada vez mais dependente de respostas prontas.

Estudos conduzidos por universidades de ponta, como Stanford, e publicados em revistas científicas como Science e Nature Machine Intelligence, revelam um padrão preocupante. Quando você se acostuma a ter tudo ao alcance de um clique ou de um comando de voz, seu cérebro simplesmente para de se esforçar. Essa facilidade cria o que os especialistas chamam de amnésia digital: em vez de registrar informações na memória de longo prazo, você terceiriza tudo para as máquinas. A consequência? Uma mente cada vez mais dispersa, incapaz de sustentar a atenção por longos períodos.

E não para por aí. A dependência constante de resumos automáticos e respostas geradas por algoritmos diminui sua autonomia intelectual. Você começa a aceitar qualquer explicação que pareça convincente, mesmo que contenha erros gritantes. Esse comportamento tem nome: viés de automação. É como se a IA assumisse o controle das suas decisões, enquanto você apenas aperta “aceitar” sem questionar. Com o tempo, esse hábito vai corroendo seu pensamento crítico, sua criatividade e até sua autoconfiança. Afinal, se você nunca pratica o exercício de investigar, comparar e refletir, por que seu cérebro manteria essas habilidades afiadas?

Pesquisadores têm observado esse impacto na prática. Um experimento conduzido pelo MIT demonstrou que usuários que escreveram redações com suporte de IA – como o ChatGPT – apresentaram, após apenas três rodadas de produção de textos, redução significativa da atividade cerebral em áreas associadas à memória, cognição e criatividade. Um alerta claro de que, quando se delega continuamente o trabalho intelectual, ocorre uma espécie de “atrofia cognitiva”, uma diminuição real da intensidade com que o cérebro processa e retém informações.

O problema também se conecta com uma tendência mais ampla que começou décadas atrás. Durante boa parte do século 20, houve um aumento gradual do desempenho médio em testes de QI, fenômeno chamado efeito Flynn. Mas a partir dos anos 1990, esse avanço foi interrompido e começou a se reverter em muitos países. Uma das razões apontadas por neurocientistas e psicólogos é justamente a externalização da memória e das habilidades cognitivas, que começou com o Google e se intensifica agora com a inteligência artificial generativa. Ao transferir o esforço intelectual para sistemas automatizados, passamos a exercitar menos nossa capacidade de raciocinar, memorizar e resolver problemas por conta própria.

Mas antes que você imagine que a IA é uma inimiga, saiba que a tecnologia em si não é o problema. A chave está no equilíbrio. Quando usada de forma consciente e moderada, ela pode ser uma aliada poderosa. O risco surge quando você transforma a IA em muleta para todas as situações, perdendo o domínio sobre aquilo que deveria ser seu: a capacidade de pensar, criar e decidir.

Se você quer manter seu cérebro ativo, desperto e capaz de fazer conexões originais, é fundamental adotar algumas práticas simples que fazem toda a diferença no longo prazo. Reserve momentos do seu dia para escrever e raciocinar sem recorrer ao assistente virtual. Antes de aceitar qualquer sugestão automática, questione: Por que essa resposta faz sentido? Eu concordo com isso? Que outra perspectiva existe aqui? Essa pergunta, tão simples, é capaz de resgatar sua autonomia.

Outro ponto essencial é estabelecer limites claros de uso. Evite recorrer à IA em todas as tarefas e separe períodos offline, principalmente à noite, quando seu cérebro precisa descansar da sobrecarga digital. Exercite deliberadamente sua memória: antes de buscar uma informação no celular, tente resgatar o que você já sabe. Esses pequenos desafios diários fortalecem sua atenção e sua capacidade de retenção.

Cultivar a criatividade também é indispensável. Se você apenas consome conteúdos prontos, seu repertório se torna limitado e repetitivo. Por isso, crie espaço para atividades que desafiem sua imaginação — desenhar, escrever à mão, ler livros densos, resolver problemas de lógica sem apoio eletrônico. Tudo isso mantém seu cérebro vivo e curioso.

E, sobretudo, não se contente com uma única fonte. Quando a IA apresentar uma resposta, compare com outras referências. Busque artigos acadêmicos, converse com especialistas, leia livros. Cada ponto de vista diferente expande seu horizonte e fortalece seu senso crítico.

A inteligência artificial veio para ficar e pode transformar sua vida de maneira positiva — mas somente se você estiver no controle. Faça dela uma parceira e não uma muleta. Mantenha acesa a chama da autonomia intelectual e preserve aquilo que torna você único: a capacidade de pensar, questionar e criar.

 

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