Do ChatGPT à sala de cirurgia: a revolução dos robôs humanoides inteligentes
Por Marcel Nobre

Enquanto ainda navegamos no boom da inteligência artificial generativa, popular por conta do ChatGPT, Gemini e Copilot, já estamos na era da IA Física: a inteligência artificial que sai da tela e começa a compor o corpo de robôs humanóides interagindo com o mundo real. Este é o ponto em que a IA passa a ser tangível e até tocável. Empresas como Boston Dynamics, Unitree, Figure AI e Tesla têm se posicionado como protagonistas nessa corrida que pode revolucionar a ciência e transformar a forma como nos relacionamos com o mundo, alterando dinâmicas sociais, econômicas e de trabalho. Além disso, algumas das principais big techs também estão entrando nessa briga, como a Meta e a NVIDIA.
A Meta, criadora do Facebook, anunciou a chegada do V-JEPA 2, um modelo treinado em vídeo que permite a compreensão e previsão de última geração no mundo real, bem como planejamento zero-shot e controle de robôs em novos ambientes. O diferencial é que o aprendizado não é por repetição: a tecnologia aprende por meio da antecipação das possíveis reações dos objetos, como cair, amassar e se mover, aprendendo assim sobre como manipulá-los. Ao todo, a Meta estima que o V-JEPA 2 tenha assistido a mais de 1 milhão de horas de vídeo para aprender movimentos. Ao ser inserido num corpo físico, como braços ou humanoides, as possibilidades são infinitas.
Já a NVIDIA traz o Isaac GROOT N1, um modelo de robô humanoide personalizável que espelha os reflexos e a intuição humana ao mesmo tempo que toma decisões. Isso acontece porque o robô é capaz de raciocinar sobre as instruções que recebe e o ambiente em que está inserido, traduzindo essas percepções em movimentos robóticos precisos. De acordo com a companhia, ele pode ser utilizado para realizar tarefas domésticas de forma autônoma, mas e se formos além? Com ambas as tecnologias sendo de código aberto, já é possível imaginar a IA Física atuando em veículos, indústrias, linhas de produção e hospitais, por exemplo, com robôs inteligentes o suficiente para costurar tecidos.
Embora ainda seja uma tecnologia extremamente cara, ela tem o potencial de reduzir tarefas repetitivas e perigosas, como a inspeção em áreas de risco, seja em mineradoras e usinas; pode ser positiva onde há escassez de mão de obra, como na agricultura e construção civil; e no avanço da qualidade de vida, à medida que proporciona auxílio doméstico e em tarefas de cuidado. Porém, não podemos ignorar os deslocamentos que a tecnologia também provoca: à medida que as atividades manuais vão sendo substituídas por robôs, precisaremos de mais pessoas que saibam operar a tecnologia, gerando um aumento exponencial de mão de obra especializada, ao mesmo tempo em que teremos menos pessoas em empregos que exigem menos qualificação e são mais acessíveis. O grande desafio aqui, é entender quem educará essas pessoas que possivelmente serão substituídas, para que ocupem as novas posições geradas pelas tecnologias emergentes.
Para o futuro, acredito numa transição gradual, impulsionada pela necessidade econômica e por pressões de eficiência. Robôs humanoides capazes de manipular objetos e realizar tarefas complexas tendem a surgir primeiro onde há ganhos de produtividade e com grande capacidade de investimentos, como grandes empresas ou indústrias. E não por muito tempo, de vê-los em larga escala nas casas e ruas, como um assistente pessoal. Os desafios de custo, energia, segurança e integração com processos existentes são reais, mas as empresas que começarem a entender e testar a IA Física agora terão vantagem competitiva quando a tecnologia amadurecer. Por enquanto, podemos olhar para ela como uma ferramenta complementar, em alguma medida possível, sendo que cada empresa e país irá entender como se posicionar nessa transição. O maior risco não é ter robôs demais, mas sim não ter pessoas preparadas para usá-los.
*Marcel Nobre é professor, pesquisador e palestrante (TEDx Speaker) de inovação, tecnologia, inteligência artificial, tendências e educação, além de empreendedor, fundador e CEO da BetaLab. É professor na HSM/Singularity, StartSe e FIA Business School. Também atua como mentor de startups pela Ace Startups, tendo apoiado mais de 50 projetos em diversos segmentos nos últimos anos. Possui MBA pela FIA/USP, e diversas especializações em Inteligência Artificial, Letramento em Futuros, Metaverso, Neurociência e Mentoring. Saiba mais: https://marcelnobre.com/.