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PLATAFORMAS NÃO PODEM SE OMITIR: JUSTIÇA CONFIRMA OBRIGAÇÃO DE RECUPERAR CONTAS HACKEADAS

Por Calza Neto

Quem nunca teve, ou ao menos conheceu alguém que teve, uma conta em rede social invadida? Golpes financeiros aplicados em seus amigos, o nome usado de forma criminosa, a reputação colocada em risco. O mais comum é que, mesmo diante de provas claras, a vítima enfrente resistência, demora e, muitas vezes, a negativa completa por parte da plataforma para recuperar o acesso pela via administrativa. Para uma usuária do Rio de Janeiro, esse pesadelo virou realidade, mas, neste caso, a Justiça agiu com rapidez e determinação.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) confirmou uma decisão que obriga a plataforma digital responsável, identificada nos autos como o Facebook, a devolver imediatamente a conta hackeada. E deixou claro: em caso de descumprimento, a multa será de R$ 20 mil.

Como a plataforma tentou se defender, e por que não conseguiu

A empresa tentou justificar o descumprimento da decisão judicial alegando não ter recebido a URL exata da conta invadida, como se a ausência desse dado inviabilizasse qualquer ação. Contudo, o argumento foi prontamente refutado pelo relator do processo, que destacou o óbvio: plataformas digitais dispõem de robustas ferramentas tecnológicas capazes de localizar perfis com base em nome, e-mail ou número de telefone, dados, aliás, comumente fornecidos pelos próprios usuários em solicitações de suporte.

Trata-se, portanto, de uma alegação que, além de fragilmente fundamentada, revela uma postura de omissão técnica deliberada. Ao recusar-se a agir com base em informações mínimas e razoáveis, a plataforma não apenas prolonga indevidamente o sofrimento da vítima, como contribui para a perpetuação de fraudes praticadas em seu ambiente digital.

Ciente dessa dinâmica, o Judiciário foi firme ao interpretar a conduta como protelatória, ou seja, voltada apenas a retardar o cumprimento da ordem judicial. O relator alertou que esse tipo de manobra pode acarretar penalidades, conforme previsto no artigo 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil, que autoriza a aplicação de multa quando recursos são utilizados com propósito meramente dilatório.

A decisão, nesse ponto, vai além da proteção individual da vítima: ela estabelece um recado claro ao mercado digital. A negligência no cumprimento de decisões judiciais não será tolerada, tampouco será admitido o uso de justificativas genéricas ou tecnicamente frágeis como escudo contra a responsabilidade.

 O que essa decisão significa para você

Se você já teve seu perfil invadido, sabe como isso pode afetar sua vida pessoal, sua imagem e até seu trabalho. A decisão do TJRJ representa um precedente que reforça um princípio essencial: ninguém pode ser obrigado a suportar indefinidamente as consequências de um ataque virtual. E mais: a responsabilidade pela devolução segura do acesso é da própria plataforma, independentemente de dados técnicos como o link direto da conta.

Quando a Justiça determina a devolução imediata do perfil, está protegendo não apenas o direito de propriedade digital, mas também a dignidade do usuário.

 Por que essa decisão é um marco

Essa decisão representa um marco por diversos motivos. Em primeiro lugar, destaca-se a rapidez e a eficácia com que a liminar foi concedida e confirmada em segunda instância, sinalizando que o Judiciário não tolera a omissão das plataformas diante de violações evidentes de direitos. Além disso, o valor expressivo da multa diária estabelecida cria uma pressão real para que a empresa cumpra sua obrigação sem espaço para desculpas ou inércia. Por fim, a decisão também se fortalece ao conter um alerta direto contramanobras protelatórias, deixando claro que recursos apresentados apenas para ganhar tempo serão combatidos com rigor, o que reforça a credibilidade e a efetividade da atuação judicial nesse tipo de conflito.

Caminhos para quem enfrenta situações semelhantes

Se você tiver sua conta em uma rede social invadida e perceber que a plataforma se mostra inerte, evasiva ou simplesmente se recusa a ajudar, não aceite o silêncio como resposta. Muitas vezes, os canais de atendimento são automatizados, ineficientes ou despreparados para lidar com situações de invasão real, o que, na prática, coloca o usuário em um estado de abandono digital, mesmo diante de prejuízos concretos.

É importante entender que você tem direitos. O acesso à sua conta é um bem jurídico protegido, e sua violação, especialmente quando resulta em fraudes, danos à imagem ou prejuízo financeiro, impõe à plataforma o dever de agir com diligência. Se isso não acontece, é plenamente cabível buscar reparação pela via judicial, tanto para recuperar o acesso quanto para ser indenizado pelos danos sofridos, inclusive morais.

Diante desse cenário, é essencial agir com estratégia e rapidez: registre um boletim de ocorrência informando a invasão, reúna todas as provas possíveis, especialmente capturas de tela da conta invadida que contenham metadados e possam ser auditadas, comunicações com a plataforma, e-mails de alerta ou de tentativa de recuperação, bem como os números de protocolo de atendimento. Essas evidências são fundamentais para demonstrar que você buscou a solução pela via administrativa e que houve omissão ou negligência da empresa.

Busque o apoio de um advogado especializado em direito digital. Ele poderá ajuizar uma ação com pedido de tutela de urgência para obrigar a plataforma a restabelecer o acesso, além de requerer indenização pelos danos causados. O Judiciário tem reconhecido, cada vez mais, que a responsabilidade das plataformas vai além de fornecer um espaço virtual, elas devem zelar pela segurança, agir com agilidade em casos de violação e reparar os danos quando falham nesse dever.

A decisão completa está publicada no Ementário de Jurisprudência Cível nº 12/2025, disponível no Portal do Conhecimento do TJRJ, sob o processo nº 0035830-88.2024.8.19.0001. Esse documento pode servir como base para outras ações semelhantes.

 

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