
A agricultura vive um de seus momentos mais decisivos desde o início da civilização. A digitalização tem revolucionado práticas milenares, transformando o cotidiano de produtores em diferentes partes do mundo. No interior da Grécia, Dimitris, um olivicultor de quarta geração, é um exemplo claro dessa nova era: seu smartphone passou a ser uma ferramenta essencial para decisões que vão desde o controle de irrigação até o planejamento da colheita e o acesso ao mercado. Essa mudança, impulsionada pela conectividade, reflete um fenômeno global: a digitalização está se tornando uma aliada indispensável para um setor pressionado por mudanças climáticas, instabilidades econômicas e desafios na cadeia de abastecimento.
O avanço das tecnologias digitais surge como resposta à imprevisibilidade do clima, à escassez de insumos agrícolas e à crescente exigência por produtividade e sustentabilidade. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) destaca que a resiliência do setor passa, cada vez mais, pelo uso estratégico de ferramentas digitais.
Além de otimizar a produção, a revolução tecnológica no campo tem o potencial de corrigir desequilíbrios históricos. Durante décadas, produtores foram os que mais arriscaram e os que menos lucraram em uma cadeia dominada por intermediários e distribuidores. Agora, plataformas de venda direta possibilitam uma reconexão entre agricultores e consumidores finais, ampliando os ganhos dos produtores — em alguns casos, gerando até 40% mais receita ao eliminar atravessadores. Essa redistribuição de valor representa mais do que um ganho financeiro: é um caminho para viabilizar inovações, atrair novas gerações ao campo e garantir a continuidade da produção de alimentos.
A digitalização também rompe com o isolamento histórico da atividade agrícola. Hoje, o conhecimento circula com agilidade: um pecuarista na Nova Zelândia pode compartilhar experiências com um criador na Argentina, enquanto um agricultor no Quênia acessa gratuitamente técnicas utilizadas na Europa. O compartilhamento de boas práticas, aliado a ferramentas de suporte remoto e informações atualizadas, eleva a qualidade da produção e encurta a distância entre o pequeno produtor e os centros consumidores.
No entanto, essa transição para o digital ainda encontra barreiras importantes. A exclusão digital persiste, especialmente em regiões remotas, onde a conectividade é precária e o custo da tecnologia segue sendo um impeditivo. Além disso, o letramento digital ainda é uma lacuna em muitos territórios rurais. Nesse cenário, a conectividade deve ser tratada como infraestrutura básica, assim como a água e a energia. A FAO reforça que sem internet no campo, o potencial transformador da tecnologia se esvai.
Soluções eficazes para esse desafio devem levar em conta as limitações locais. Plataformas que funcionam offline e oferecem funcionalidades escaláveis, conforme a estrutura disponível, tendem a ter maior adesão. Do mesmo modo, programas de capacitação digital, com foco em trocas intergeracionais, têm mostrado bons resultados: jovens conectados ajudam a integrar agricultores experientes ao universo digital, promovendo uma evolução sem abandonar o saber tradicional.
Para empresas e profissionais do setor AgTech, os aprendizados são claros. A tecnologia precisa ser intuitiva e desenhada a partir da realidade do campo. Quanto mais simples e funcional for a solução, maior será sua aceitação. Iniciativas que envolvem o agricultor desde o desenvolvimento da ferramenta geram mais engajamento e resultado. O foco, portanto, deve estar em ampliar a sustentabilidade, fortalecer o ecossistema produtivo e não apenas aumentar a produtividade individual.
A digitalização não representa apenas uma atualização técnica. Ela redefine papéis, valoriza o conhecimento local, dá voz ao produtor e prepara o setor para responder a crises ambientais e alimentar uma população crescente. A agricultura inteligente é, antes de tudo, uma agricultura conectada — com pessoas, ideias e soluções.
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